Preservação digital: Um bem necessário
O conceito de preservação digital está na ordem do dia, tendo-lhe sido conferido o estatuto de Dia Mundial da Preservação Digital, pela Digital Preservation Coalition, em 2017. Desde essa data, comemora-se a efeméride na primeira quinta-feira de novembro, com o intuito de consciencializar para a necessidade de se criarem boas práticas na preservação do património digital, nas suas múltiplas representações.
Podemos facilmente constatar, que grande parte das interações da modernidade são mediadas tecnologicamente, alicerçadas em múltiplos Sistemas de Informação (SI), funcionando em redes globais, sem constrangimentos de espaço e de tempo. Com efeito, podemos observar que nos dias de hoje são produzidas, armazenadas e disseminadas grandes quantidades de informação digital em distintos formatos e suportes.
Paralelamente, as políticas públicas dos últimos 20 anos em Portugal, procuram acelerar a denominada transição digital, a desmaterialização de processos e procedimentos. O ambiente digital, possibilita a digitalização de serviços, promovendo por essa via a acessibilidade, recuperabilidade e reutilização da informação digital.
Foram vários os serviços que beneficiaram, neste novo paradigma da transição digital, como o e-commerce, e-services e o e-Govermment, onde destacamos, por exemplo o Portal das Finanças e a Autenticação.gov, com efetivos ganhos para o cidadão, no acesso aos serviços públicos. Esses serviços geram grandes quantidades de informação digital, com um valor probatório e informativo, registos das evidencias, da realização das funções, atribuições e responsabilidades das organizações, incluindo a Administração Pública.
Contudo, o digital acarreta riscos, que necessitam de ser acautelados, os riscos de obsolescência. Podemos entender, a obsolescência tecnológica numa perspetiva multidimensional, que se reporta à perda de funcionalidade, acessibilidade e usabilidade, de produtos ou serviços que decorrem em ambiente digital, tornando-os ultrapassados e inacessíveis. Desde logo, a obsolescência programada, promovida por fabricantes e fornecedores, que deliberadamente descontinuam formatos de ficheiros, suportes, software ou componentes de hardware tornando-os inoperacionais. Estima-se que o horizonte de obsolescência, comporta o período compreendido entre 5 a 7 anos em que ocorre a obsolescência tecnológica. Torna-se por isso fundamental a definição de estratégias para mitigar os efeitos dos diversos riscos de obsolescência.
No caso da Administração Pública Portuguesa, considerando as obrigações legais e o valor probatório, pretende-se uma verdadeira gestão integrada da informação eletrónica, desde o momento em que é produzida, com garantias de manutenção dos requisitos de autenticidade, integridade, fidedignidade e usabilidade. Para isso, concorrem os Sistemas de Gestão Documental (SGD), conforme os requisitos técnicos e funcionais, inscritos no MoReq2010, elaborado pelo DLM Fórum, um consórcio europeu para a promoção da interoperabilidade técnica entre diversos SGD no espaço europeu, salvaguardando metadados, objetos digitais, promovendo a sua gestão.
Recomenda-se a elaboração de Planos de Preservação Digital, com a definição de estratégias que garantam a funcionalidade dos SI e a preservação da informação digital, cuja necessidade da administração, ultrapassa o horizonte de obsolescência, como a adoção de software open source, avaliação e atualização de software, formatos de ficheiros normalizados e migração da informação.
Consideramos também, os Repositórios Digitais Confiáveis (RDC), baseados no modelo Open Archival Information System (OAIS) desenvolvido pela NASA, para guardar grandes volumes de informação resultante da exploração espacial. Aquele modelo de requisitos é o garante da ingestão, preservação e manutenção do acesso, no longo prazo, da informação digital. Este modelo é amplamente utilizado em Arquivos, Biblioteca, Museus e Repositórios Institucionais Universitários, possibilitando a criação de registos de metadados e a associação de objetos digitais, virtualizando a sua consulta e perpetuando o seu acesso.
Os organismos da Administração Pública, as instituições da memória e do conhecimento, procuram desta forma minimizar os riscos da obsolescência tecnológica, garantir o acesso e consulta da informação digital, salvaguardando o passado e construindo o futuro.
Por Nuno Branco, do Núcleo de Documentação e Arquivo da SGPCM.
Última atualização: 08 de novembro, 2024